Trocar anualmente ou manter,
eis a questão

Substituir o carro por um zero-quilômetro todo ano
ou ficar com ele por mais tempo? Tire essa dúvida

Texto: Fabrício Samahá

— Eu troco de carro todo ano. Tenho sempre um veículo confiável, coberto pela garantia e com poucas despesas de manutenção. E como o “pulo” é menor, fica mais fácil trocar novamente no ano seguinte.
 
— Pois eu prefiro trocar a cada dois ou três anos. Meu gasto com manutenção ainda é menor do que a depreciação do primeiro ano de uso.
 
Essa conversa hipotética com certeza já aconteceu entre muitos — e pode ter ocorrido com você. De quanto em quanto tempo (ou quilometragem) trocar de carro é uma dúvida que persegue boa parte dos que podem fazer essa escolha. Como há vantagens e desvantagens em cada uma das opções, decidimos analisá-las para ajudar o leitor.

POR QUE TROCAR TODO ANO

Algumas vantagens desta primeira opção são evidentes. Estar sempre com um carro novo representa maior confiabilidade, como menor risco de ficar na estrada. Problemas iniciais podem ser sanados sem ônus pela garantia, que é em geral de um ano, embora às vezes seja limitada pela quilometragem. A mão-de-obra das primeiras revisões é gratuita e os custos de manutenção são mais baixos, pois ainda não é preciso substituir itens caros como pneus, embreagem e amortecedores.

Todo o conjunto do carro é mais agradável no início. Com o passar do tempo, surgem folgas, imprecisões e desgastes que não inviabilizam o uso, mas reduzem aos poucos a segurança e o prazer de dirigir. Sem falar em aspectos emocionais, como o status e a satisfação de possuir um veículo novo. Trocar todo ano enseja também a possibilidade de corrigir logo uma opção malfeita — por exemplo, a compra impensada de um modelo de duas portas para a família, em vez da versão de quatro portas.
 
Entretanto, uma alegação freqüente dos que prefeririam trocar de carro anualmente é a depreciação, que tornaria difícil “pular” novamente para o zero-quilômetro após alguns anos de uso. A esses é preciso esclarecer que, mesmo com um índice de depreciação fixo (veja o gráfico número 1), a perda de valor se torna cada vez menor com o passar dos anos.

POR QUE MANTER O USADO

É exatamente em decorrência da desvalorização que pode valer a pena usar o carro por dois, três ou mesmo quatro anos. Como a perda de ano para ano é cada vez menor, manter o automóvel usado significa um gasto a menos que facilitará em muito a próxima troca.
 
Vamos exemplificar supondo inflação zero e tomando como base um índice de depreciação anual, fixo, de 20%. Em vez de trocar três vezes de carro num período de três anos, pagando por cada um R$ 20 mil e obtendo na venda R$ 16 mil (depreciação de 20%), você pode pagar uma única vez os R$ 20 mil e obter cerca de R$ 10,2 mil na venda, após três anos de uso (as perdas acumuladas somam 48,8%). Ao finalmente trocar de carro, você investe apenas R$ 9,8 mil, algo menos que os R$ 12 mil que teria gasto se o trocasse três vezes. É provável que essa economia de R$ 2,2 mil cubra as despesas com manutenção que a troca anual evitaria.
 
Na realidade a depreciação não ocorre de forma constante, em razão das flutuações naturais de mercado. O que se tem verificado ao analisar as tabelas de usados é que no primeiro ano há uma desvalorização acentuada, da ordem de 20% a 25%, que se reduz bastante no segundo ano e deste para o terceiro. A partir do quarto ou quinto ano há uma quase estabilização do valor, limitando-se a depreciação anual a menos de 10%. Uma das razões para isso é o preço mais baixo do usado, que aumenta a procura e gera valorização. Refeitos os cálculos de depreciação (veja o gráfico número 2), verifica-se vantagem ainda maior em permanecer com o mesmo carro por vários anos.
 
Esses índices não são fixos, porque cada modelo sofre uma depreciação diferente. De maneira geral, os carros importados e os de luxo desvalorizam mais e em menor tempo, pois sua manutenção é mais onerosa e sua aquisição, quando novos, está mais condicionada ao status que num modelo de classe inferior. O mesmo vale para os esportivos, que ganham imagem de “carro ralado” quando usados. Já os “populares” e veículos com reputação de grande resistência têm menor depreciação.

Outro ponto importante são os opcionais. Apesar da tendência de se valorizarem itens como ar-condicionado e direção assistida, continua grande a depreciação dos veículos assim equipados. Ou seja, poucos compradores de usados se dispõem a pagar por esses equipamentos. Outros acessórios de menor utilidade, que podem representar 20% de acréscimo no preço do carro novo, chegam a perder integralmente o valor em poucos anos. Trocar de carro anualmente, portanto, pode sair ainda mais caro se tiverem sido agregados muitos opcionais.
 
A essas vantagens básicas aliam-se algumas outras, como o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), que cai na mesma proporção do valor do veículo. O prêmio (custo) do seguro também decresce, embora em menor escala, já que algumas das despesas contratadas — como a reposição de peças em colisões — não ficam mais baratas com o tempo. E ainda se gasta menos tempo e dinheiro com instalação (ou transferência) de som e acessórios, emplacamento e vistoria do veículo novo.
 
Por outro lado, é preciso levar em conta que aqueles que rodam muito anualmente podem não aproveitar a vantagem financeira, uma vez que os gastos com manutenção tendem a aumentar bastante. De uma maneira geral, deve-se considerar como ideal rodar entre 10.000 e 12.000 quilômetros por ano. Mais do que isso pode afetar a estratégia de ficar mais tempo com o mesmo veículo.
 
Quando, então, trocar de carro? A resposta exata exigiria um cálculo específico para cada caso, que levasse em conta depreciação, custo de manutenção por ano e o quanto se roda. O fator obtido indicaria o momento da troca: é quando o aumento das despesas com a conservação coloca em risco a vantagem da menor desvalorização do usado. De modo geral, porém, pode-se afirmar que este momento fica além do período de um ano que tantos crêem ser o ideal para ficar com um automóvel.


COMPRA DO USADO É BOA OPÇÃO?

Levado pela reportagem, o leitor pode concluir ser vantajoso trocar com freqüência seu carro usado, mas não por um zero-quilômetro e sim por outro usado, mais novo. Assim, evitaria rodar com um veículo ultrapassado ou muito antigo, sem o inconveniente da depreciação acentuada do primeiro ano.
 
É um ponto de vista relativo. A compra freqüente de modelos usados traz um maior risco de se adquirir carros maltratados, com defeitos graves, recuperados de acidentes ou mesmo roubados. Se feita em concessionárias, onde as garantias em tese são maiores, a operação pode não compensar pelo custo — paga-se mais pelo carro comprado e recebe-se menos pelo que é vendido em troca. Assim, nossa orientação se limita ao período ideal da troca do usado por um novo.
 
Vale lembrar que o que determina a conveniência de manter o carro por alguns anos é a situação do mercado num determinado período. Se todos ampliassem seu período de troca, os semi-novos seriam valorizados e os zero-quilômetro tenderiam a ficar mais baratos. Nesse novo contexto, talvez passasse a valer a pena trocar de carro todos os anos.


DEPRECIAÇÃO CONSTANTE DE 20% AO ANO

Valor do Okm Após 1 ano Após 2 anos Após 3 anos Após 4 anos Após 5 anos
20.000 16.000 12.900 10.240 8.192 6.553

Esta primeira tabela mostra como ocorre a desvalorização de um carro, em teoria: com um índice de depreciação constante de 20% ao ano, a perda de valor é cada vez menor. A partir do segundo ano, o percentual é aplicado sobre o preço do ano anterior, e não mais sobre o do carro zero-quilômetro. Não ocorre, portanto, a perda absoluta de valor em cinco anos (cinco vezes 20%), como muitos acreditam.

DEPRECIAÇÃO VARIÁVEL

Valor do Okm Após 1 ano Após 2 anos Após 3 anos Após 4 anos Após 5 anos
20.000 15.000 13.913 12.648 11.498 10.746

A segunda tabela revela como acontece na realidade uma depreciação típica, constatada nas tabelas de carros usados: acentuada no primeiro ano, reduz-se fortemente já no segundo e terceiro anos, e torna-se bastante suave do quarto ano em diante. Com o que se gastaria numa troca precipitada, já no primeiro ano de uso, é possível pagar a manutenção por um bom tempo.

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Publicado em 1998

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