Eu troco de carro todo ano. Tenho sempre um
veículo confiável, coberto pela garantia e com poucas
despesas de manutenção. E como o pulo é
menor, fica mais fácil trocar novamente no ano seguinte.
Pois eu prefiro trocar a cada dois ou três anos.
Meu gasto com manutenção ainda é menor do que a
depreciação do primeiro ano de uso.
Essa conversa hipotética com certeza já aconteceu entre
muitos e pode ter ocorrido com você. De quanto em
quanto tempo (ou quilometragem) trocar de carro é uma
dúvida que persegue boa parte dos que podem fazer essa
escolha. Como há vantagens e desvantagens em cada uma
das opções, decidimos analisá-las para ajudar o
leitor.
POR QUE TROCAR TODO ANO
Algumas vantagens desta
primeira opção são evidentes. Estar sempre com um
carro novo representa maior confiabilidade, como menor
risco de ficar na estrada. Problemas iniciais podem ser
sanados sem ônus pela garantia, que é em geral de um
ano, embora às vezes seja limitada pela quilometragem. A
mão-de-obra das primeiras revisões é gratuita e os
custos de manutenção são mais baixos, pois ainda não
é preciso substituir itens caros como pneus, embreagem e
amortecedores.
Todo o conjunto do carro é mais agradável no início.
Com o passar do tempo, surgem folgas, imprecisões e
desgastes que não inviabilizam o uso, mas reduzem aos
poucos a segurança e o prazer de dirigir. Sem falar em
aspectos emocionais, como o status e a satisfação de
possuir um veículo novo. Trocar todo ano enseja também
a possibilidade de corrigir logo uma opção malfeita
por exemplo, a compra impensada de um modelo de
duas portas para a família, em vez da versão de quatro
portas.
Entretanto, uma alegação freqüente dos que prefeririam
trocar de carro anualmente é a depreciação, que
tornaria difícil pular novamente para o
zero-quilômetro após alguns anos de uso. A esses é
preciso esclarecer que, mesmo com um índice de
depreciação fixo (veja o gráfico número 1), a perda
de valor se torna cada vez menor com o passar dos anos.
POR QUE MANTER O USADO
É exatamente
em decorrência da desvalorização que pode valer a pena
usar o carro por dois, três ou mesmo quatro anos. Como a
perda de ano para ano é cada vez menor, manter o
automóvel usado significa um gasto a menos que
facilitará em muito a próxima troca.
Vamos exemplificar supondo inflação zero e tomando como
base um índice de depreciação anual, fixo, de 20%. Em
vez de trocar três vezes de carro num período de três
anos, pagando por cada um R$ 20 mil e obtendo na venda R$
16 mil (depreciação de 20%), você pode pagar uma
única vez os R$ 20 mil e obter cerca de R$ 10,2 mil na
venda, após três anos de uso (as perdas acumuladas
somam 48,8%). Ao finalmente trocar de carro, você
investe apenas R$ 9,8 mil, algo menos que os R$ 12 mil
que teria gasto se o trocasse três vezes. É provável
que essa economia de R$ 2,2 mil cubra as despesas com
manutenção que a troca anual evitaria.
Na realidade a depreciação não ocorre de forma
constante, em razão das flutuações naturais de
mercado. O que se tem verificado ao analisar as tabelas
de usados é que no primeiro ano há uma desvalorização
acentuada, da ordem de 20% a 25%, que se reduz bastante
no segundo ano e deste para o terceiro. A partir do
quarto ou quinto ano há uma quase estabilização do
valor, limitando-se a depreciação anual a menos de 10%.
Uma das razões para isso é o preço mais baixo do
usado, que aumenta a procura e gera valorização.
Refeitos os cálculos de depreciação (veja o
gráfico número 2), verifica-se vantagem ainda
maior em permanecer com o mesmo carro por vários anos.
Esses índices não são fixos, porque cada modelo sofre
uma depreciação diferente. De maneira geral, os carros
importados e os de luxo desvalorizam mais e em menor
tempo, pois sua manutenção é mais onerosa e sua
aquisição, quando novos, está mais condicionada ao
status que num modelo de classe inferior. O mesmo vale
para os esportivos, que ganham imagem de carro
ralado quando usados. Já os populares
e veículos com reputação de grande resistência têm
menor depreciação.
Outro ponto importante são os opcionais. Apesar da
tendência de se valorizarem itens como ar-condicionado e
direção assistida, continua grande a depreciação dos
veículos assim equipados. Ou seja, poucos compradores de
usados se dispõem a pagar por esses equipamentos. Outros
acessórios de menor utilidade, que podem representar 20%
de acréscimo no preço do carro novo, chegam a perder
integralmente o valor em poucos anos. Trocar de carro
anualmente, portanto, pode sair ainda mais caro se
tiverem sido agregados muitos opcionais.
A essas vantagens básicas aliam-se algumas outras, como
o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores
(IPVA), que cai na mesma proporção do valor do
veículo. O prêmio (custo) do seguro também decresce,
embora em menor escala, já que algumas das despesas
contratadas como a reposição de peças em
colisões não ficam mais baratas com o tempo. E
ainda se gasta menos tempo e dinheiro com instalação
(ou transferência) de som e acessórios, emplacamento e
vistoria do veículo novo.
Por outro lado, é preciso levar em conta que aqueles que
rodam muito anualmente podem não aproveitar a vantagem
financeira, uma vez que os gastos com manutenção tendem
a aumentar bastante. De uma maneira geral, deve-se
considerar como ideal rodar entre 10.000 e 12.000
quilômetros por ano. Mais do que isso pode afetar a
estratégia de ficar mais tempo com o mesmo veículo.
Quando, então, trocar de carro? A resposta exata
exigiria um cálculo específico para cada caso, que
levasse em conta depreciação, custo de manutenção por
ano e o quanto se roda. O fator obtido indicaria o
momento da troca: é quando o aumento das despesas com a
conservação coloca em risco a vantagem da menor
desvalorização do usado. De modo geral, porém, pode-se
afirmar que este momento fica além do período de um ano
que tantos crêem ser o ideal para ficar com um
automóvel.
COMPRA DO USADO É BOA OPÇÃO?
Levado pela reportagem, o leitor pode concluir ser
vantajoso trocar com freqüência seu carro usado, mas
não por um zero-quilômetro e sim por outro usado, mais
novo. Assim, evitaria rodar com um veículo ultrapassado
ou muito antigo, sem o inconveniente da depreciação
acentuada do primeiro ano.
É um ponto de vista relativo. A compra freqüente de
modelos usados traz um maior risco de se adquirir carros
maltratados, com defeitos graves, recuperados de
acidentes ou mesmo roubados. Se feita em
concessionárias, onde as garantias em tese são maiores,
a operação pode não compensar pelo custo
paga-se mais pelo carro comprado e recebe-se menos pelo
que é vendido em troca. Assim, nossa orientação se
limita ao período ideal da troca do usado por um novo.
Vale lembrar que o que determina a conveniência de
manter o carro por alguns anos é a situação do mercado
num determinado período. Se todos ampliassem seu
período de troca, os semi-novos seriam valorizados e os
zero-quilômetro tenderiam a ficar mais baratos. Nesse
novo contexto, talvez passasse a valer a pena trocar de
carro todos os anos.
DEPRECIAÇÃO CONSTANTE DE 20% AO ANO
Valor do Okm |
Após 1 ano |
Após 2 anos |
Após 3 anos |
Após 4 anos |
Após 5 anos |
20.000 |
16.000 |
12.900 |
10.240 |
8.192 |
6.553 |
Esta primeira tabela mostra como ocorre a
desvalorização de um carro, em teoria: com um índice
de depreciação constante de 20% ao ano, a perda de
valor é cada vez menor. A partir do segundo ano, o
percentual é aplicado sobre o preço do ano anterior, e
não mais sobre o do carro zero-quilômetro. Não ocorre,
portanto, a perda absoluta de valor em cinco anos (cinco
vezes 20%), como muitos acreditam.
DEPRECIAÇÃO
VARIÁVEL
Valor do Okm |
Após 1 ano |
Após 2 anos |
Após 3 anos |
Após 4 anos |
Após 5 anos |
20.000 |
15.000 |
13.913 |
12.648 |
11.498 |
10.746 |
A segunda
tabela revela como acontece na realidade uma
depreciação típica, constatada nas tabelas de carros
usados: acentuada no primeiro ano, reduz-se fortemente
já no segundo e terceiro anos, e torna-se bastante suave
do quarto ano em diante. Com o que se gastaria numa troca
precipitada, já no primeiro ano de uso, é possível
pagar a manutenção por um bom tempo.
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