Data de publicação: 7/4/12

Um pedaço de Primeiro Mundo

Sem fabricantes locais, mas aberto a carros do mundo todo, o Chile
mostra desenvolvimento e organização em seu sistema viário

por Fabrício Samahá

Fabrício Samahá, editor

Viajar ao exterior e conhecer novos lugares — como acontece de tempos em tempos com a imprensa, a convite de fabricantes para avaliar seus lançamentos — é sempre interessante. Alguns dedicam seu tempo para absorver a cultura e a história do local por meio de passeios turísticos. Em meu caso, um dos passatempos é observar o trânsito, as soluções viárias e os veículos para poder compartilhar impressões com os leitores do Best Cars.

Tive mais uma dessas oportunidades duas semanas atrás por ocasião do lançamento do Fiat Grand Siena, realizado no Chile, parte na capital Santiago e parte na região de Viña del Mar, na província de Valparaíso, distantes 100 quilômetros entre si. Para quem ainda não conhecia o país, rodar por essas e entre essas cidades (infelizmente, só como passageiro em Santiago) e observar seu trânsito trouxe interessantes conclusões.

Não há como negar: a primeira surpresa de quem vai a Santiago, em se tratando de automóveis, é a atualidade da frota. Embora a grande maioria dos carros na capital pareça ter menos de cinco anos, não é a isso que me refiro — mesmo porque não é muito diferente nas regiões de classe média ou superior de São Paulo, por exemplo. Os chilenos têm acesso às últimas novidades de quase todas as marcas do mundo, pelo que circulam por lá carros que ainda não temos, embora produzidos por empresas instaladas aqui.

Exemplos? Muitos: Chevrolet com os pequenos Spark e Sonic; Citroën com C3 e C4 de nova geração e os requintados DS3 e DS4; os novos utilitários europeus Doblò, Ducato e Fiorino da Fiat; Ford Focus de terceira geração e o novo Ranger que está por chegar aqui; Hyundai com o pequeno Accent e o esportivo Genesis Coupe; o belo compacto Kia Rio em versões hatch e sedã; Peugeot com o 207 francês (hatch e conversível); Renault com o atual Mégane hatch, os maiores Laguna e Latitude e o utilitário esporte Koleos; Toyota com o compacto Yaris e o hatch médio Auris, da mesma família do Corolla; e Volkswagen com Polo e Golf da atual produção europeia. Há ainda a alemã Opel, com os novos Corsa, Astra, Meriva e Insignia, e a Alfa Romeo com MiTo, Giulietta, 159 e Brera.

O que traz essa modernidade ao mercado do Chile é, em parte, a ausência de fábricas de carros no país — nem mesmo montagem de kits, ou CKD, existe. Como tudo é importado, não haveria sentido em aplicar a tributação protecionista que temos aqui
— e, assim, o público tem acesso ao melhor da produção mundial, mesmo em segmentos de carros pequenos e médios. Por que os chilenos importariam um Golf de quarta geração do Brasil, se podem ter a sexta feita na Alemanha? Por que andariam de Celta e Agile, se Spark e Sonic estão à disposição? E quem precisa de um 206 remodelado se pode ter o verdadeiro 207 que roda na Europa?

Pelas condições iguais para todos, mas também pela proximidade com a Ásia pelo litoral voltado ao Oceano Pacífico, o Chile mostra grande participação de marcas japonesas, sul-coreanas e chinesas na frota, incluindo as que não temos aqui. Táxis comuns são, muitas vezes, pequenos da Kia, Hyundai e da japonesa Mazda, enquanto o grande SM5 da Renault-Samsung sul-coreana é bastante usado como táxi de luxo (a marca oferece também o médio SM3 e o ainda maior SM7, com versão V6 de 3,5 litros). Fabricantes chineses ainda ausentes do Brasil, como BYD, Geely, Great Wall, Haima e Zotye, além do indiano Tata, estão presentes por lá.

GranCabrio em 10 minutos
Nas ruas, marcas de alto prestígio são comuns a ponto de surpreender. Em 10 minutos de observação do trânsito de uma importante via — a Autopista Costañera Norte — a partir da janela do quarto de hotel, notei um Maserati GranCabrio, cinco ou seis Mercedes-Benz Classe E da atual geração (incluindo o cupê) e um Classe S recente, um Porsche Cayman, um cupê BMW Série 6 e diversos Audis A6, para ficar nos exemplos mais chamativos. Onde no Brasil se consegue ver tudo isso passar em 10 minutos em pleno horário comercial? Sem falar no Mercedes SLS AMG visto no estacionamento do aeroporto.

Apesar da profusão de modelos, não espere encontrar no Chile uma variedade cromática maior que a nossa: como no mundo todo, tons de prata e cinza são os que predominam. Preto e branco têm participação razoável; vermelho, pequena; e outras cores quase não são vistas. O percentual de utilitários esporte e picapes parece um pouco mais alto que nos grandes centros brasileiros, sem chegar à hegemonia que eles alcançam nos Estados Unidos.

Outra constatação: teto solar é bastante mais raro por lá que na Argentina, embora mais comum que no Brasil. O que causa estranheza, pois a latitude da região central do país onde está a capital (maior que a de todo o Brasil), em tese, tornaria esse equipamento mais desejável.

O trânsito de Santiago — como toda a cidade — passa uma impressão de organização inesperada na América Latina, um verdadeiro pedaço do Primeiro Mundo aqui perto. A Costañera Norte tem um sistema de vias subterrâneas, construído há alguns anos, que corta boa parte da capital como alternativa às vias da superfície, com acessos e saídas frequentes e cobrança eletrônica de pedágio por trecho. Vendo o tráfego de cima ou circulando de carro e de ônibus (do evento, não público), a sensação foi de que tudo flui sem sobressaltos, como deve ser. Nada de buzinadas à toa, nada de imprudências.

Motos são muito raras na cidade: circulando, as que vi não somam 10, a maioria de scooters. Paradas, formavam uns 50 metros de estacionamento. Imagino que a eficácia do transporte público — com um metrô muito elogiado pelas pessoas com quem conversei — seja um dos fatores responsáveis, já que o clima da região não chega a ser impeditivo para se andar em duas rodas.

Rodamos por estradas na ligação entre Santiago e a Viña del Mar, além de um breve trajeto perto da Viña para avaliação do Grand Siena. O que se pôde notar foi asfalto de qualidade, boa sinalização e um tráfego ordenado, mesmo que a fiscalização de velocidade pareça escassa (um motorista com que conversamos confirmou que radares são raros). Lombadas? Só encontrei duas, ambas no percurso de teste: uma em frente a uma escola, mas tão suave que para um brasileiro parecia mera imperfeição do asfalto, e uma alta e longa, na via estreita (paralela a uma rodovia) que passava pela vinícola usada como base pela Fiat. Piso esburacado, não achei.

Ao contrário de seus vizinhos argentinos, os chilenos quase que só usam gasolina em carros de passeio — óleo diesel está praticamente reservado a utilitários e caminhões. Mesmo um picape como o antigo Ranger (que recebeu o sufixo Heritage) vem apenas com opção a gasolina, embora seja possível ter motor a diesel em um utilitário esporte compacto como o VW Tiguan, que aqui não pode usá-lo. A gasolina é vendida lá em três níveis de octanagem (91, 95 e 98 octanas RON) e não custa pouco — entre R$ 3,00 e R$ 3,40 o litro em Santiago, conforme o tipo —, mas seu rendimento é superior ao da nossa por não conter álcool. O diesel fica ao redor de R$ 2,50.

No próximo Editorial, uma comparação dos mercados brasileiro e chileno sob um ponto de vista crucial: preços.

Em 10 minutos de observação, notei um Maserati GranCabrio, sem falar no Mercedes SLS AMG visto no aeroporto
 
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