Importados ao alcance

Depois de tantas turbulências, carros que vêm de fora ganham
preços atraentes e fazem bem à competição do mercado

por Fabrício Samahá

Os carros importados estão mais acessíveis novamente. Lançamentos dos últimos meses têm mostrado essa nova e boa fase para o mercado brasileiro, que já passou por tantos altos e baixos desde que a importação voltou a ser permitida, em 1990. Boa fase, sim, pois a concorrência o faz crescer e se desenvolver. E só não gosta disso quem prefere a comodidade de não precisar competir.

Nos últimos dias chegaram bons exemplos. O Kia Cerato, sedã médio sul-coreano com porte e conteúdo de Honda Civic, vem a preço bem mais baixo que o do "irmão menor" deste último, o City. O Suzuki SX4, a meio caminho entre um hatch médio-pequeno e um utilitário esporte compacto, traz tração integral pelo preço de um Ford EcoSport similar (em equipamentos e motorização) com tração apenas dianteira. E o primeiro modelo da chinesa Chery, o Tiggo, custa 20% menos que o EcoSport mais próximo em motor e conteúdo. Vale notar que o Tiggo, por ser montado no Mercosul (Uruguai), escapa do Imposto de Importação de 35% que incide sobre o Cerato e o SX4. Portanto, sem esse tributo os preços do Kia e do Suzuki poderiam ser ainda mais atraentes.

Semanas antes houve mais novidades importadas a preço competitivo. O Mitsubishi Pajero Dakar vem da Tailândia, paga o citado imposto e concorre diretamente com o Toyota Hilux SW4, feito na Argentina e menos tributado. O novo Ford Fusion, isento do imposto por vir do México (país com o qual o Brasil mantém acordo comercial), chega na versão de 2,5 litros e 173 cv, com mais itens de conforto e segurança, a preço próximo ao do nacional Corolla SE-G, de apenas 1,8 litro e 136 cv, que é ainda um carro bem menor.

Estariam esses importadores perdendo dinheiro? É evidente que não. Os que produzem aqui os carros dos exemplos é que estão, como tenho dito sempre, sendo eficientes de menos ou lucrando demais. E nenhuma dessas opções leva a bons resultados por muito tempo dentro de um mercado competitivo.

Altos e baixos
Nestes quase 20 anos aberto a importações (após 14 anos de fechamento, pois até 1976 eram liberadas), nosso mercado passou por um sobe-e-desce da competitividade dos modelos de fora em relação aos feitos aqui.

Quando chegaram, os importados eram artigos de luxo. Os primeiros Civic e Corolla custavam de 30% a 35% mais que um nacional do mesmo segmento, como Monza, Santana e Tempra, e modelos de luxo — mesmo os que não pertenciam a marcas de alto prestígio — passavam facilmente de 100 mil dólares da época, caso do Alfa Romeo 164, que estreou ainda em 1990 por 135 mil. Iniciativas de trazer carros menores e mais acessíveis, como as de Suzuki, Daihatsu, Kia e Hyundai, nem sempre davam certo porque o preço final com tributos não fazia frente ao dos modelos locais. A exceção foi a russa Lada, que conseguiu valores atraentes, mas enfrentou problemas de qualidade.

Com o passar do tempo, algumas empresas encontraram formas mais econômicas de logística, como a Fiat, que passou a trazer o Tipo da Itália nos mesmos navios que exportavam automóveis brasileiros. Esse hatch médio pode ser considerado um divisor de águas para o setor, pois chegou em 1993 a preço muito competitivo aos de Kadett e Escort, apesar do Imposto de Importação.

Fabrício Samahá, editor

O momento de ouro dos importados começou em setembro de 1994, quando se baixou da noite para o dia o imposto de 35% para 20%, quebrando o programa de reduções graduais firmado pelo governo. De repente, importar saía mais barato que produzir aqui e o mercado se viu repleto de novas opções, como Astra e Mondeo belgas, Ranger norte-americano, Tempra SW italiana, Golf GL alemão e GLX mexicano (até então vinha apenas o GTI do México) e Fiesta espanhol (embora este já estivesse planejado antes). Agora era possível comprar um Suzuki Swift GTI ou um Citroën AX GTI por menos que os nacionais Uno Turbo e Gol GTI, um Renault Laguna ou um Subaru Legacy completo por menos que um Vectra CD feito aqui ou, ainda, um Golf GTI mais barato que um Pointer GLi 2,0 local. O dólar valia em novembro, mês da tabela a que me refiro, R$ 0,85.

Contudo, em fevereiro seguinte uma ducha gelada esfriava as importações: a alíquota dava um salto para 70%, inviabilizando muitos planos e reconfortando os mais acomodados dentro da indústria nacional. Em questão de meses, à medida em que os antigos estoques se esgotavam, os preços subiam até 40%. Não é à toa que os modelos 1995, trazidos no período de imposto baixo, foram e ainda são bem mais comuns no mercado de importados usados que os de outros anos próximos.

Depois dessa turbulência as alíquotas voltaram a cair e, com a estabilização da economia promovida pelo Plano Real, os estrangeiros retomaram a fase de competitividade. Em meados de 1998, com o dólar a R$ 1,16, comprava-se um Honda Accord 2,3 ao preço de um Omega CD 4,1 nacional, um Ford Explorer por 10% mais que um Blazer Executive feito aqui (ambos V6, com caixa automática e tração nas quatro rodas) ou um Golf GL (já mexicano e ainda da antiga geração) mais barato que um Escort GLX argentino, ambos de 1,8 litro.

Só que novo susto viria pouco depois. Em fevereiro de 1999 a cotação da moeda norte-americana explodia de R$ 1,20 para R$ 1,75/R$ 1,80, trazendo um pesadelo a importadores e consumidores. Vários modelos lançados ou com lançamento definido pouco antes da tempestade, como o Omega australiano, o Alfa Romeo 156, o novo VW Passat e o Toyota RAV4, ficaram muito mais caros do que suas estratégias de mercado podiam prever. Com a cotação estabilizada em R$ 1,70, em julho daquele ano o sedã da GM custava 62% mais, em reais, que seu antecessor feito em São Caetano do Sul, SP no ano anterior. Em várias marcas o aumento médio chegava a superar 50% nos valores sugeridos, mas na prática o mercado tinha de trabalhar com cotações promocionais do dólar para desovar os estoques.

Quando as coisas pareciam mais calmas, veio o receio da economia pela expectativa da eleição de Lula à presidência, em 2002. O dólar superou R$ 2,50 em julho, chegou a R$ 3 em outubro e estourou os R$ 3,60 no mês seguinte (sempre nas médias mensais), com reflexo direto nos produtos importados. Comprar carro feito no exterior havia voltado a ser demonstração de riqueza, até porque as opções mais em conta deixavam de existir — não havia condições de competição com os nacionais em preço. Na indústria local, a ordem era substituir componentes importados por brasileiros, como fez a Fiat ao usar o motor 1,8 da GM no lugar do 1,6 italiano. Só em meados de 2005 a cotação média voltava a cair abaixo de R$ 2,50, deixando os importados novamente atraentes.

Para alívio de uns e queixas de outros — os fabricantes locais, que lamentam perder espaço no mercado internacional —, o dólar vem caindo desde então. Passou bastante tempo ao redor de R$ 2, desceu a R$ 1,60 na média de agosto e setembro do ano passado e, mesmo tendo voltado a R$ 2,30, está hoje abaixo da barreira dos R$ 2. O imposto mantém-se em 35% há bastante tempo e, com o mercado consumindo grande volume de automóveis, surgem melhores condições de negociação com os fabricantes lá fora. Isso explica o bom momento dos importados.

Quanto vai durar? Ninguém sabe, e talvez por isso sua aceitação não seja maior: muitos têm receio de que nova turbulência na economia eleve os preços de peças de reposição ou mesmo derrubem modelos — e até marcas — do mercado, o que implicaria grande depreciação e manutenção cada dia mais difícil. Fatores como esses levam, e continuarão a levar, muita gente a preferir sempre o carro nacional, não importa quanto custem e o que ofereçam os estrangeiros.

O momento de ouro começou em setembro de 1994, quando o imposto caiu de 35% para 20%. De repente, importar saía mais barato que produzir aqui e o mercado se viu repleto de novas opções.

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Data de publicação: 29/8/09

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