Henry Ford em seu primeiro
automóvel, o Quadricycle, e o pioneiro Ford Modelo A de 1903, que deu
início ao empreendimento desse americano
Coupe de
dois lugares e o conversível Touring, duas das muitas versões do carro
que foi responsável pela
popularização do automóvel |
Nenhum século alterou mais o curso da história da humanidade que o XX.
Da navegação ao homem na lua, do rádio à internet, da segregação aos
direitos civis, das mulheres que nem votavam às presidentes de
companhias, da influência da cultura francesa à globalização
americana... Inúmeras e profundas transformações se processaram numa
velocidade sem precedentes que revolucionou a economia, as cidades, a
vida das pessoas. Ao usar a linha de montagem na produção de seu Modelo
T, lançado há 100 anos, Henry Ford alcançou outra proeza inédita: deu
acesso para milhões de pessoas à independência proporcionada pelo
automóvel.
Foi um conquista gradual para o empresário americano (leia
boxe sobre ele), que havia concluído seu primeiro automóvel, o
Quadricycle, em 1896. Com o Modelo A de 1903, fundou a Ford Motor
Company e tentou desde cedo tornar seu produto mais simples e acessível
para um público mais amplo. Afinal, desde 1886, quando surgiu na
Alemanha o Benz Patent-Motorwagen, o
automóvel era um meio de transporte restrito a um público de maior poder
aquisitivo, fosse ele equipado com motor a combustão a gasolina ou com
propulsão elétrica, também já existente.
Nos Estados Unidos, o automóvel passou a ser produzido em 1893 com o
Buggyaut de J. Frank e Charles Duryea, mas a primeira tentativa
bem-sucedida de um carro vendido em maior escala seria o
Oldsmobile Curved Dash. Levaria cinco anos
para a Ford conseguir criar um modelo de baixo custo e confiável como
seu fundador sonhava. Ainda no início de 1907, o empresário separou uma
área em sua fábrica no número 254 da Piquette Avenue, em Detroit, para
se dedicar ao que ele chamava de "carro universal".
Entre o Ford Modelo A de 1903 e o Modelo S de 1908, uma sucessão de
automóveis mais modernos havia sido lançada, sempre com foco na
praticidade e em um preço que, nas palavras do empresário,
"qualquer pessoa com um bom salário pudesse pagar". Foram vendidos 20
mil carros da Ford nesse período. Em 1º de outubro de 1908 Henry apresentava, para o ano-modelo 1909, o carro com o qual gravaria seu
nome definitivamente na história, o Modelo T. O lançamento oficial só se
daria no dia 31 de dezembro no Grand Central Palace de Nova York.
A preços a partir de 825 dólares, o novo Ford ainda era produzido de
maneira artesanal. A princípio a idéia de um carro popular era vista por
muitos como piada, um negócio sem futuro. Contudo, ainda era cedo para
prever até onde Henry pretendia chegar com o projeto. Como os
métodos fabris da Ford literalmente dependiam de manufatura — os carros
eram feitos a mão —, a fábrica da Piquette Avenue não dava conta da
demanda. Só 11 carros foram concluídos no primeiro mês,
dando razão aos pessimistas inicialmente. Mal sabiam eles o que estava
por vir...
Precursor
dos flexíveis
O motor dianteiro e
refrigerado a água era atípico por ter os quatro cilindros em linha num
bloco só, quando o usual na época era a disposição individual para cada
um deles. Os cabeçotes removíveis eram outros recursos modernos do Ford
T. As válvulas eram laterais. Com cilindrada de 2.896 cm³ (177 pol³),
ele produzia a potência de 20,2 cv a 1.600 rpm e o torque máximo de 11,4
m.kgf a 900 rpm. Podia chegar a velocidades entre 64 e 72 km/h,
dependendo da versão, com consumo que variava de 5 a 9 km/l.
É o
combustível que escondia um dos mais curiosos e pouco comentados
talentos do Modelo T. Ele funcionava tanto com gasolina quanto com
etanol, mas a redução no custo do primeiro e a introdução da Lei Seca
nos EUA enfraqueceriam o apelo do álcool como combustível. Se essa
habilidade não pôde ser aproveitada, não faltaram outras que tornavam o
T um compêndio de soluções técnicas da época.
Continua
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