Consultório de Preparação


por Iran Cartaxo


Audi S2 supera a RS2 Porsche com preparação no turbo


Sou proprietário de uma Audi S2 Avant. Seu motor é de 5 cilindros, 20 válvulas com turbo e intercooler a 0,8 kg/cm². Gostaria de saber até quanto posso aumentar a pressão do turbo e o que precisaria trocar.

Raphael Takaoka
takaoka@uol.com.br

São Paulo, SP


A preparação mais fácil para a S2 Avant é realmente o aumento da pressão do turbo: não é difícil de ser feita, mantém a originalidade do conjunto e produz ótimos resultados em termos de aumento de potência. Este motor suportaria bem uma preparação na parte aspirada, como comando, cabeçote e válvulas, pois os regimes de rotação originais não são muito elevados. Mas haveria dificuldade na aquisição das peças necessárias, exigindo a importação de componentes e tornando a relação custo-benefício desinteressante.

O maior problema a ser enfrentado no aumento da pressão de operação do turbo é reajustar toda a eletrônica embarcada para trabalhar com as novas condições. Há um grande risco, em função do despreparo de muitos profissionais da área, que o serviço seja mal executado, resultando em uma preparação com mais problemas que benefícios. Mas uma preparação malfeita pode ser identificada fazendo-se três perguntas antes de fechar o negócio:

As curvas de potência (as mais altas) e de torque estimadas para a Audi S2 Avant original (em azul), com turbo a 1 kg/cm2 (em verde) e com turbo a 1,6 kg/cm2 (em vermelho), em regime normal de funcionamento (sem overboost)

Clique aqui para ver as curvas de potência e torque ampliadas


- Como a pressão será aumentada? Caso o preparador responda que "será adicionada uma válvula ao tubo de pressão que aciona a válvula de alívio", dispense o serviço e procure outra loja. Este recurso é simples e realmente aumenta a pressão de operação do turbo, pois "engana" a válvula de prioridade fazendo-a pensar que o turbo está operando a uma pressão mais baixa do que a real. Mas a "válvula de disfarce" (como é chamada a válvula colocada no tubo de acionamento da válvula de alívio) é um fator de risco, pois pode facilmente desregular, impedindo o acionamento do alívio, fazendo a pressão subir e estourando o motor.

A resposta correta do preparador a esta pergunta, para a S2 Avant, seria: "o acionamento da válvula de alívio de seu carro é feito por uma válvula eletromagnética, comandada pela central de injeção. A programação da central de injeção será alterada para que o alívio seja feito somente quando a pressão for maior". Este é o procedimento que traz menos riscos à preparação. Para carros que não dispõem de tantos recursos como a S2 e não têm um acionamento eletrônico da válvula de alívio, a resposta deveria ser que "a válvula de alívio será trocada por uma que permita regulagem, assim a pressão do turbo poderá ser aumentada".

- Como a injeção de combustível será adequada? As respostas erradas a esta pergunta são: "a injeção vai perceber o aumento de pressão e se ajustar" ou "não será necessário reajustar a injeção neste caso", ou até " a pressão da linha de combustível será aumentada para prover a alimentação necessária". Nos três casos, fuja do preparador. Os dois primeiros procedimentos resultarão em alimentação insuficiente, pois a injeção não é projetada para se adequar a este tipo de mudança no carro. A mistura então ficará pobre e seu carro fatalmente detonará (clique aqui para saber mais sobre detonação), causando grande prejuízo. A última solução pode ser a mais destrutiva: realmente aumenta a quantidade de combustível injetado, mas isso ocorre em todos os regimes, mesmo quando o turbo não está operando. Deste modo o carro ficará com um consumo muito elevado, a linha de combustível será submetida a uma pressão para a qual não foi projetada, podendo estourar ou vazar (trazendo o risco de incêndio), e os bicos injetores e a bomba de combustível terão a vida útil reduzida.

As respostas adequadas são: "a injeção será remapeada para prover a maior quantidade de combustível quando a pressão for maior" ou "colocaremos uma caixa de gerenciamento adicional que alterará o funcionamento dos bicos quando a pressão for maior, injetando mais combustível", ou mesmo "colocaremos uma caixa de gerenciamento e bicos injetores adicionais, que injetarão mais combustível quando a pressão for maior". Estes procedimentos proverão a quantidade de combustível necessária à nova pressão e não aumentarão o consumo nos outros regimes, quando o turbo não estiver operando, pois podem ser regulados para só interferir no funcionamento do sistema quando as condições de operação forem diferentes da original.

- Como a curva de avanço do ponto de ignição será alterada? As respostas erradas são: "isso não precisa ser feito", "a injeção tem sensor detonação, que vai perceber quando ela ocorrer e reajustar o ponto" ou "o ponto inicial será alterado, o que vai mudar toda a curva, deixando o sistema adequado". Mais uma vez, a injeção não foi projetada para perceber e ajustar-se a este tipo de mudança nas condições de funcionamento, e sim para contornar pequenas mudanças -- ainda assim tomando-as como defeito e não como otimização do funcionamento do motor. Desta forma, a adequação feita pela própria injeção é inadequada para venenos. Se nada for modificado o avanço do ponto, muito grande para a nova pressão, fará o motor detonar. Já o reajuste apenas do ponto inicial desajustará toda a curva, ficando o avanço pequeno quando o turbo não estiver operando ou quando a pressão for baixa, o que resultará em alto consumo, lentidão de resposta do motor e menor potência.

Respostas coerentes seriam: "a injeção será remapeada reajustando a curva de avanço do ponto de ignição, principalmente quando a pressão for maior" ou "colocaremos uma caixa de gerenciamento adicional que alterará a curva de avanço quando a pressão for maior". Ambos os procedimentos permitem o correto ajuste da curva de avanço, resultando em maior potência, menor consumo e garantia de não ocorrência de detonação.

O cuidado na escolha de um bom preparador, que disponha de conhecimento técnico e de recursos para proceder as alterações necessárias, é muito importante. Sobretudo no seu caso, onde o motor está bastante otimizado e o turbo já opera a uma elevada pressão (0,8 kg/cm²) aliada a uma alta taxa de compressão de 9,3:1. Isso já indica condições bastantes duras de funcionamento, e revela uma ótima regulagem e controle feitas pela injeção. Qualquer mudança mal efetuada pode resultar em grande prejuízo, pois o risco de detonação está muito próximo.

Seu motor dispõe de um recurso interessante, o overboost ou sobrepressão, que pode ser aproveitado na preparação, desde que o preparador seja capaz de realizar os reajustes lançando mão do remapeamento da injeção. Como a pressão de operação do turbo é controlada pela central de injeção através de válvula eletromagnética, ela foi programada para, quando perceber a condição de acelerador pressionado ao máximo, produzir um aumento de 0,15 kg/cm² na pressão que dura 30 segundos e eleva a potência do motor de 230 cv para 250 cv. Através do remapeamento a preparação do motor pode ser feita somente na condição de overboost, deixando o motor original quando usado normalmente. Quando o acelerador for pressionado ao máximo, a sobrepressão pode ser maior, produzindo bem mais que 250 cv.

A aceleração de seu carro é obtida em regime de overboost, mas a velocidade final é atingida em condição normal de pressão, por isso a simulação de sua preparação foi especialmente complexa. Foi simulado um aumento de pressão de operação do turbo no regime normal, assim o overboost se dá sobre a nova pressão, resultando em melhora na velocidade final e na aceleração de 0 a 100 km/h. Caso a pressão seja aumentada só no regime de overboost, a velocidade final não será alterada, ocorrendo somente redução no tempo de 0 a 100.

Foram simulados um aumento de 0,2 kg/cm² na pressão do turbo, resultando em 1 kg/cm² em regime normal e 1,15 kg/cm² em overboost; e um aumento de 0,8 kg/cm² na pressão do turbo, com redução da taxa de compressão em 1,5 ponto para evitar detonação, resultando em 1,6 kg/cm² em regime normal e 1,75 kg/cm² em overboost. Caso seja aumentada somente a pressão de overboost, desconsidere os novos valores de velocidade final e a alteração recomendada para o câmbio.

Veja o desempenho esperado em regime normal de funcionamento -- sendo somente o 0-100 km/h calculado para o regime de overboost:

  Original Turbo a
1,0 kg/cm
2
Turbo a
1,6 kg/cm
2
Potência máxima 230 cv 258 cv 326 cv
Potência máxima com overboost 250 cv 280 cv 354 cv
Rotação de potência máxima 5900 rpm 5900 rpm 5750 rpm
Velocidade máxima 238 km/h 248 km/h 268 km/h
Rotação à velocidade máxima 5840 rpm 6065 rpm 6555 rpm
Aceleração de 0 a 100 km/h 7,1 s 6,5 s 5,4 s
Torque máximo 35,7 mkgf 40,0 mkgf 50,5 mkgf
Torque máximo com overboost 38,7 mkgf 43,4 mkgf 54,8 mkgf
Rotação de torque máximo 1950 rpm 1950 rpm 1900 rpm
Alongamento recomendado
na relação de transmissão
- 2,8 % 14,0 %
Aumento recomendado na
injeção de combustível
- 16,7 % 66,7 %
Aceleração longitudinal
no interior do veículo
0,87 g 0,96 g 1,14 g
A margem de erro é de 5% (para cima ou para baixo), considerando-se instalação bem-feita. Calculamos a aceleração de 0 a 100 km/h e a aceleração longitudinal máxima (sentida no interior do automóvel) a partir da eficiência de transmissão de potência ao solo do carro original. Para atingir os resultados estimados pode ser necessária a recalibragem da suspensão, reforços no monobloco e/ou o emprego de pneus mais largos. A velocidade máxima estimada só será atingida com o ajuste recomendado da relação final de transmissão. Os resultados de velocidade são para velocidade real, sem considerar eventual erro do velocímetro. A rotação à velocidade máxima é calculada considerando a relação atual de transmissão.
Algoritmo de simulação de preparação de motores desenvolvido pelo consultor
Iran Cartaxo, de Brasília, DF.


A primeira preparação dispensa modificações na suspensão, freios, rodas e pneus da S2 Avant, já bastante bem-dimensionados para o uso esportivo. Já a elevação em 0,8 kg/cm² na pressão do turbo requer um reestudo desses componentes, tendo como parâmetro a versão RS2 preparada pela Porsche e produzida em série especial de apenas 3.000 unidades. A RS2 trazia freios reprojetados pela Porsche e rodas 7 x 17 pol. com pneus 245/40 ZR 17, enquanto os da S2 são 205/55 ZR 16. O maior problema não está na transmissão de potência ao solo, otimizada pela tração integral permanente que distribui o torque entre os eixos conforme a necessidade, e sim nos espaços de freada e comportamento em curva. Caso prefira manter os componentes originais de sua Avant, Raphael, cuide em mantê-los em excelente estado e em utilizar com moderação o ganho de desempenho obtido.

A propósito, com os cavalos adicionais gerados pela preparação, sua S2 Avant está em condições de encarar numa saída de semáforo a famosa RS2. Seu carro não tem as pinças de freio vermelhas com o logotipo Porsche, mas em desempenho pode deixar assustado o proprietário de um exemplar da série especial.



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